Ironman World Championship 2011


Fiquei impressionado com o Ironman de Kona realizado no último dia 8 de outubro. Como em qualquer triatleta, esta prova causa-me profundo impacto e dela sempre procuro tirar lições e ensinamentos para o dia em que eu for ao Havaí disputá-la. Os dados aqui apresentados são uma tradução livre de um post de Kevin Mackinnon (http://ironman.com/events/ironman/worldchampionship/kona2011/kevin-mackinnon-recaps-an-incredible-day-of-racing-at-the-ford-ironman-world-championship#axzz1b9HgLRw7) e as fotos foram retiradas de diversos sites. Mas apresento também o meu próprio ponto de vista sobre um aspecto que vem sofrendo grandes modificações com o passar dos anos: a especificidade. Antes de tocar nesse assunto, convido-os a conhecer um pouco mais a respeito desta verdadeira prova de fogo.

A PROVA

Todo triatleta sabe que a data mais importante do ano é o dia do IRONMAN WORLD CHAMPIONSHIP. Esta é a prova que fez nosso esporte atingir a maioridade, e também é a competição que define tudo.

Para estar na linha de largada em Kona, você deve ou ter muita sorte e conseguir a vaga através de um sorteio, ou ser muito talentoso, e conquistá-la através de um dos eventos qualificatórios realizados ao redor do mundo.

Dezenas de milhares de triatletas tentam, a cada ano, obter uma dessas cobiçadíssimas posições. Este ano, apenas 1800 conseguiram.

Isso significa que 1800 “sortudos” tiveram a oportunidade de se testar em um dos maiores desafios que o mundo do esporte tem para oferecer: 3,8 km de natação, 180 km de pedal e uma maratona através de um mar bravio e de um terreno desafiador coberto de lavas vulcânicas.

Embora existam milhares de triathlons em todo o mundo, este é o que realmente define o esporte. Tudo começou em uma cerimônia de premiação de uma corrida de revezamento realizada em Honolulu nos idos de 1977. Um grupo de atletas locais discutiu a idéia de uma prova de endurance combinando três grandes eventos que já existiam na ilha. John Collins sugeriu juntá-los e fazê-los em um único dia. Mais tarde, naquela noite, Collins subiu ao palco anunciando que “quem terminasse em primeiro lugar, seria chamado de “IRONMAN”. Desde então, o evento se tornou a “Copa do Mundo” do triathlon. O que o torna tão único é que atletas “médios” competem ao lado dos melhores do planeta.

CRAIG ALEXANDER ENTRA PARA A HISTÓRIA

 

Craig Alexander, no dia 8 de outubro de 2011, tornou-se uma lenda – ele passou a ser um dos quatro homens do mundo que venceram o IRONMAN WORLD CHAMPIONSHIP pelo menos três vezes. Escreveu seu nome em uma lista que inclui Dave Scott, Mark Allen e Peter Reid. “A corrida foi quase perfeita”, disse ele. “É o que você sonha, o que você aspira e o que fica para fazê-lo sair para treinar”.

Alexander passou um ano inteiro pensando nesta prova. Ele teve muita classe ao dizer que foi “espancado” pelos três melhores atletas de 2010, e que isso não foi fácil. “No ano passado doeu muito”, disse ele. “Principalmente porque eu tinha uma boa corrida. Mas, Chris (McCormack), Marino (Vanhoenacker) e Andy (Andreas Raelert) dificultaram as coisas. Então, eu disse aos meus amigos que precisaria treinar mais. Esta prova foi o fruto de todo este trabalho duro”.

Eis o que Alexander fez: juntou-se ao clube dos três vencedores ilustres, estabeleceu um novo recorde para o percurso de Kona (08:03:56) e também se tornou o primeiro homem a vencer tanto o IRONMAN quanto o CAMPEONATO MUNDIAL DE IRONMAN 70.3 no mesmo ano. “Eu imaginei que seria incrível se alguém pudesse ganhar ambos os campeonatos”, disse ele a respeito dessa façanha.

E é justamente sobre este aspecto que quero me deter um pouco mais.

Eu sou do tempo em que o mundo não era tão específico quanto o é hoje. Os professores dominavam todas as disciplinas, os médicos curavam todas as doenças, advogados defendiam quaisquer causas e o Pelé jogava em todas as posições – até mesmo no gol!

Pelo que me lembro, foi, mais ou menos, nos anos 70 que a especificidade começou a entrar em campo de uma forma mais incisiva. Professores tornaram-se mestres em determinadas matérias, muitos médicos especializaram-se na falange quirodáctila articulada do metacarpo, os causídicos defendem teses cada vez mais minuciosas e pormenorizadas, e o Pelé… Coitado… Acho que ficaria de fora da seleção do Mano Menezes!

Lembro-me disso ter-se tornado muito evidente, bastante cedo, na natação. Nadadores especializaram-se em provas curtas, que iam de 100 a 200 metros, outros em médias distâncias, na faixa dos 400 metros e, por fim, os fundistas, especialistas em 1500 metros. Hoje ainda há os maratonistas aquáticos, que nadam em mar aberto, distâncias acima de 5000 metros. Todos esses espetaculares atletas da água esforçam-se para não invadir a praia dos outros e ficam, como dizem alguns, “cada um no seu quadrado”.

Confesso que nada tenho contra a especialização, mas, no entanto, sinto profunda admiração e respeito por atletas que conseguem provar que ela é, às vezes, pouco significativa. E esse, em minha opinião, foi o grande mérito de Craig Alexander tornando-se, este ano, campeão mundial de half e de full iron. Através de um parecer muito pouco técnico eu diria que quem é bom, é bom em qualquer distância, é bom em qualquer tempo e é bom em qualquer terreno. Ou como diria o meu mestre, professor Daniel Rech: “quem é bom já vem do ovo!”

Voltando ao excepcional feito de Alexander, sua vitória foi o resultado de uma incrível melhora no ciclismo – ele andou treze minutos mais rápido do que o melhor tempo que já fizera em Kona!

“Eu estava me sentindo bem – muito confortável na natação e na bike. Então, na corrida, Andy colocou pressão sobre mim. Eu estava correndo a 3’ 34”/ km e estava sendo alcançado. Pensei: estou dentro! Do 6º ao 29º quilômetro, corri fora da minha zona de conforto.

 Vi, no ano passado, que esta corrida é estratégica, mas não queria desistir do tempo que havia trabalhado tanto para conseguir. Tive que assumir o risco, pois queria correr como um atleta que já havia vencido a prova anteriormente. Eu queria ser o homem que controlava as coisas.”

Quem conhece Alexander sabe que ele é humilde e rápido em elogiar os grandes que o precederam no esporte. “Para ser justo com as feras do passado, nosso esporte tem sido muito fortemente apoiado pela tecnologia”, disse ele, referindo-se ao fato de haver quebrado um recorde que se mantinha desde 1996.

Durante a prova, por longo tempo, Alexander teve que suportar fortíssimas cãibras. Elas surgiram nos últimos sete quilômetros da corrida e forçaram-no a uma verdadeira luta. “Sempre há um momento em que as cãibras aparecem”, disse ele. “Eu corri sem as cápsulas de sal. Senti-me bem na passagem pelas special needs e sequer peguei a minha sacola. No 35º quilômetro eu estava sentindo-as nas isquiotibiais e panturrilhas – eu estava iniciando a subida da Colina Mark e Dave e achei que isso me ajudaria. Eu chegaria ao topo e faria alguns alongamentos. Eu tinha uma vantagem de seis minutos e soube que Pete havia andado um pouco. Então eu pensei que daria tudo certo. Se Paula pode andar na Ali’i Drive, então qualquer um pode…”

Alexander, sabendo que estava a um pace recorde, esqueceu-se completamente das cãibras. Na descida da Palani Road ouviu Mike Reilly anunciar: “ele vai quebrar o recorde!” Então, percebeu que poderia fazê-lo e deu um pequeno sprint.

O sprint foi o suficiente para colocar Craig Alexander no livro dos recordes e estabelecê-lo como o homem mais rápido do mundo neste percurso. E esse foi apenas um dos recordes que ele bateu nessa prova. Bom para o nosso esporte é que Craig Alexander está mais uma vez vestindo o manto de campeão do mundo – embaixadores como ele são especiais.

Faço questão de mencionar o fantástico desempenho de Chrissie Wellington.

Apesar dos inúmeros ferimentos sofridos durante um treino de bike

 a menos de duas semanas, a moça levantou seu quarto título (08:55:08).

 

Quem assistiu a prova, diz que era visível em sua expressão toda a dificuldade que estava sentindo. A natação, extremamente prejudicada pela perda de flexibilidade, não foi suficiente para desanimá-la. Pouco a pouco foi galgando posições e, merecidamente, chegou à vitória.

 

O Ironman World Championship 2011 foi uma verdadeira aula sobre as principais virtudes do esporte: determinação, força de vontade e garra. Craig Alexander e Chrissie Wellington são os mestres e espero ter a capacidade de assimilar os seus incontáveis ensinamentos.

Para encerrar, quero deixar aqui os meus parabéns a todos àqueles que se superam diariamente. Parabéns a todos os que treinam em qualquer piscina, em qualquer mar, pedalam com todos os tempos e correm por qualquer terreno. Parabéns aos “triatletas genéricos” que encaram toda e qualquer dificuldade. Afinal, a vida é para quem topa qualquer parada e não para quem pára em qualquer topada! Parabéns à Chrissie Wellington pelo exemplo de gana e de superação. Parabéns a Craig Alexander pelos recordes e por derrubar o mito da especificidade!

Que Deus continue sempre nos abençoando!

Abraços e beijos,

Juarez Arigony